A mudança mais significativa que a dita “Revolução Digital” trouxe foi a percepção do tempo. As coisas parecem frescas na memória, mas ao olhar para o calendário, passou-se quatro ou cinco anos.
Entre esses tempos, dentro dos grupos e pessoas que seguia — e ainda sigo — no Instagram, muito se produziu sobre os quatro temperamentos.
O assunto foi na verdade o presságio do TDAH, TEA e assemelhados.
Há pouco mais de dez anos as pessoas eram envoltas com o horóscopo, as conjunções entre Marte e Júpiter e o Retorno de Saturno.
Os temperamentos surgiram com a mesma intensidade.
Apenas como justificativa para ignorar as próprias contradições pessoais.
Uma ferramenta mui antiga que caiu em certo desuso com o passar dos anos, ressurge em um monte de vídeos explicativos de um minuto definindo a sua personalidade, o seu caráter, os seus gostos, as suas paranoias e toda sorte de coisas alheias às suas ações, reações, afetos e projetos.
Verdade de seja dita, o conhecimento acerca dos temperamentos abriu um leque de opções na vida daqueles que andavam perdidos.
É como se tivessem acabado de descobrir o Brasil.
Parece que era um monte de questões onde se procurava um monte de respostas e de repente, como em um passe de mágica surge algo com nome, formato, fundamento e que se encaixa perfeitamente nas suas dúvidas.
Não é ironia minha. Foi o que pensei de fato.
Não nego a eficácia do conhecimento dos temperamentos como uma importante ferramenta para a compreensão humana. Não é só uma ferramenta para ser bem sincero! É uma chave de acesso para um estágio mais profundo da alma humana.
(Os mais entendidos sobre o assunto podem achar até um certo exagero da minha parte. Corro esse risco de estar exagerando mesmo. Mas não me importa. Corro o mesmo risco de em algum momento da minha vida retificar esse pensamento. Por isso, aqui o registro).
Quanto mais se conhecia sobre temperamentos, menos se sabia a verdade.
Na mesma medida que você acessa à verdade, surge uma barreira de mentiras.
Se você é preguiçoso, há certo tempo você diria:
Tenho preguiça
Depois, se você percebeu que é preguiçoso, você não era mais.
Agora você é fleumático
Hoje você não é mais preguiçoso é só
o seu déficit de antenção que desvia as suas energias vitais para um lugar de distração
(Nunca vi perder a energia pra limpar a bunda, mas enfim… não sou psicólogue, não é meu lugar de fala)
Resumindo…
Foi uma esteria na época. A galera escolhia o namorado pelo temperamento.
Ah, é que você é colérico, não dá pra namorar com você! Eu sou sanguínea, sabe? Sou muito feliz, gosto de voar por aí, como o vento
Tá, e o Quico?
O que teve de gente que ganhou dinheiro falando sobre os temperamentos.
Não que julgue como errado. Acho muito é certo!
Mas e a galera que mal leu Galeno, Hipócrates e dava palestrinha, era promotor, juiz e advogado da causa do temperamento.
Sentença segundo melancólicos. Decisão do Exmo. Sr. Sanguíneo. Cumpra-se, assina o colérico.
Novamente, o temperamento nunca foi o problema. Mas toda a problematização vs. solução que envolveram algo tão simples, prático e bom. “Paulo Freirizaram” os temperamentos — sim, sou bom com neologismos.